Desabafo sobre a solidão

Demorou pra ser e agora não será mais

 Demorou pra ser e agora não será mais 

É verdade que dizem que o silêncio muitas vezes é melhor que qualquer palavra, ela já leu sobre isso em alguns textos, mas só quem está sufocado por um pensar inquietante é que sabe o quanto falar pode ser libertador. 

Em algumas pessoas dizer o que sente faz parte de suas necessidades mais íntimas.

Os amigos tentando adivinhar o que ela sentia aconselharam-na deixar pra lá, esquecer. Como? Se só ela sabia de fato o que estava sentindo. 

Muito embora ela fosse uma mulher de fé que por muito tempo acreditou na mudança, no renascimento, persistiu na manutenção daquela situação, calou-se e entendeu além da conta, todavia, não mais.

Ela estava chegando, coração a palpitar havia passado e repassado centenas de vezes a tal cena na sua cabeça. Chegou, enfim, ele já a esperava, entrou. Ele sorriu, por quê? Ela não resistiu e sorriu de volta. 

Ele quis começar a falar, ela o interrompeu com um gesto, dizendo que não. Afinal, ela propôs o encontro, precisava falar, colocar um ponto final naquela situação.

Estava com raiva, queria xingar, gritar e arrancar toda aquela dor de dias e noites mal dormidas. 

No entanto não o faria, após meses de terapia e conversas sobre não magoar, não ofender atacando as pessoas em seus pontos mais fracos, prometeu a si mesma que só usaria a inteligência para dominar seus instintos. 

Embora gostasse muito de cerveja preferiu pedir água, o álcool a deixava mais leve, feliz e amigável, definitivamente não era a intenção.

Resolveu acender um cigarro para tomar coragem, má ideia, suas mãos que tremiam foram denunciadas, apagou o cigarro imediatamente.

Ele esperava com um olhar apreensivo e curioso, talvez já soubesse o tema do assunto, mas respeitando sua vontade, aguardava, apenas. 

Ela se encheu de coragem e começou o que mais parecia um discurso, falou da maneira mais delicada e pontuada que encontrou dentro de si, acalmando aquele turbilhão de emoções que percorriam seu corpo, sangue e consciência. 

Não usou as palavras que tinha em mente, não deu, não lembrou, as falas decoradas lhe fugiram. Em certo momento, sentiu a voz falhar e os olhos marejarem…parou, respirou, tomou água. 

Lágrimas não são argumentos como dizia Machado de Assis, e ela ainda não havia terminado os seus.

Continuou, enfim. Olhos nos olhos, ele a encarava como se já soubesse de tudo aquilo, quis fazer considerações, mais uma vez ela pediu que não o fizesse. 

Ela procurou algo que talvez estivesse ocultado, não tendo encontrado nada, terminou sua água, levantou. Não queria retórica, ambos sabiam que ela estava certa, ele errou, ela teve esperança demais, esperou em demasia, ou seja, errou também.

Antes que ela partisse ele a vislumbrou de modo nunca feito antes e em seus olhos existiam um misto de compaixão, arrependimento e vitória até, balbuciou “sinto muito” ela discordou, respondendo “mentira, sou eu quem sente muito, adeus”.

Não dava mais tempo para nada. Estava sufocada. Saiu quase correndo. Agora sim, deixou que todas as lágrimas contidas ganhassem a liberdade. Não se importou com as pessoas que a olhavam. Estava feliz, de certo modo. 

Havia conseguido fechar aquela porta e sabia, em seu íntimo, que nunca mais a abriria, não por orgulho, mas por convicção. Já conhecia exatamente o que encontraria do outro lado. Definitivamente, ela não merecia passar por aquilo de novo.

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