Desabafo sobre a solidão

José Mauro de Vasconcelos: Muito além do meu pé de laranja lima

José Mauro de Vasconcelos: Muito além do meu pé de laranja lima 

Além da história que encantou o mundo, é com grande prazer que apresento meu novo artigo sobre José Mauro de Vasconcelos. Tenho um carinho especial por ele, especialmente por "Meu Pé de Laranja Lima", um dos primeiros livros que li, por indicação da minha mãe, que leu praticamente todas as obras de Vasconcelos. 

A história encantou o mundo inteiro, vendeu mais de meio milhão de exemplares e foi lida por quase todos que sabiam ler na época.

José Mauro de Vasconcelos, dotado de imaginação poética, grande habilidade para contar histórias e uma vasta experiência de vida, não ambicionou ser escritor; foi obrigado a sê-lo. Seus romances já não cabiam dentro dele e tiveram que sair para alcançar a liberdade e nos proporcionar prazer. 

O autor precisava contar histórias, deixar suas emoções fluírem e nos fazer viver aventuras oníricas e muitas vezes inocentes, mas capazes de trazer reflexões sobre a vida, a morte e as amizades. Aos 22 anos, ele iniciou sua produção literária com o livro “Banana Brava”.

José Mauro de Vasconcelos não é apenas o autor de “Meu Pé de Laranja Lima”; ele é muito mais do que isso. Foi através dele e de seus livros que descobri o quanto ler pode ser mágico. Muitas de suas histórias nos levam a um mundo repleto de sensibilidade e emoções à flor da pele.

“Rosinha Minha Canoa” também foi um grande sucesso do autor. Poético e profundo, o livro conta a história de Zé Orocó, um homem simples e sua canoa, que lhe proporciona aventuras delicadas sobre a natureza, a vida e o amor, todas repletas de lirismo e significado.

“Coração de Vidro” traz fábulas encantadoras sobre a árvore, o peixe, o cavalo campeão e o pássaro. Embora sejam histórias lúdicas e infantis, elas carregam mensagens fortes e verdadeiras. 

Através delas, percebemos como mudamos ao longo da vida e como coisas simples que costumavam nos tocar de repente perdem seu sentido. É a vida nos tornando duros.

Dentre meus favoritos do autor está também “Palácio Japonês”, uma história dolorida, mas com boas intenções e extrema sensibilidade. O livro conta a história de Pedro, um artista solitário e frustrado, que conhece um palácio oculto na Praça da República e o príncipe Tetsuo. 

O autor descreve o palácio como:

 “não é dado a todo mundo a maravilha de ver todas as maravilhas”

E assim cresce uma amizade entre Tetsuo e Pedro. A obra apresenta uma forma mais natural e menos assustadora de abordar a morte.

Citei meus livros favoritos do autor, os mais graciosos e comoventes. Em certa ocasião, o próprio autor descreveu-se assim: 

“Antigamente, quando escrevia, deixava entrever minha ternura, mas com muito medo. Foi preciso que chegasse aos quarenta anos para perder o medo da minha ternura e derramar por minhas mãos, que queimam de carinho (quase sempre sem ter ninguém para o receber), a simplicidade deste meu livro.”

Claro que li outros livros de José Mauro de Vasconcelos na biblioteca particular da minha mãe, como “Doidão”, “Chuva Crioula”, “O Garanhão das Praias” e “Rua Descalça”. Esses livros apresentam histórias mais pragmáticas.

José Mauro de Vasconcelos nasceu no Rio de Janeiro em 26 de fevereiro de 1920 e faleceu em 1984 em São Paulo. Criado em Natal, sonhava em ser nadador, mas não conseguiu. 

Trabalhou como treinador de peso-pluma no boxe, carregador de bananas, pescador, professor primário, garimpeiro, ator de cinema, jornalista, locutor de rádio e, para sorte de quem o conheceu, escritor.

 Apesar de não ser o que ele achava, preferia mesmo era servir de enfermeiro para os índios, exercendo importante trabalho junto aos irmãos Villas-Bôas e lutando pelos indígenas.

Ele gostava de ler os romances de Graciliano Ramos, Paulo Setúbal e José Lins do Rêgo. Tinha um método intrínseco de escrever: escolhia os cenários e personagens e depois viajava para o local onde ocorreria a trama. Para escrever "Arara Vermelha", percorreu cerca de 450 léguas no sertão bruto.

Construía todo o romance na mente, inclusive as frases dos diálogos, e costumava dizer: 

"Quando a história está inteiramente feita na imaginação, é que começo a escrever. Só trabalho quando tenho a impressão de que o romance está saindo por todos os poros do corpo. Então vai tudo a jato."

Injustiçado e marginalizado pela crítica, embora aclamado pelo público, seus livros venderam muito e tiveram sucessivas reedições. 

Não ganhou uma cadeira na Academia Brasileira de Letras e não teve seu valor reconhecido como autor, talvez por sua forma simples de escrever e conduzir os leitores, por seu sentimentalismo exacerbado ou por ser considerado um escritor popular e só para mulheres. 

A verdade é que José Mauro não escrevia apenas para um público específico, mas para todos que estivessem dispostos a deixar a imaginação fluir e a conhecer um pouco mais da vida, sem temer derramar algumas (ou muitas) lágrimas.

Suas obras são um convite a refletir sobre o mundo com seus afetos, encantos e desencantos. Foi graças a ele, por ter despertado em mim a magia, o hábito e o estímulo da leitura, que hoje posso ler Machado de Assis, Guimarães Rosa, Aluísio Azevedo e outros. 

Encerro este texto com um sentimento de profunda gratidão, pela minha mãe e por José Mauro de Vasconcelos. Obrigada!

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